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Caso Toyota: Como Gerenciar Crises

Os recentes recalls promovidos pela Toyota atingiram o pilar mestre da montadora, cuja estória foi construída em torno da qualidade total e do sistema homônimo, denominado produção enxuta ou lean manufacturing. Introduzido a partir do final da segunda guerra mundial, tinha como objetivos aumentar a produtividade da indústria japonesa e  reduzir o estereótipo de produto ruim.

Com o passar das décadas, termos como kanban e just-in-time foram introduzidos ao vocabulário de consultores e especialistas ao redor do mundo. A moda era produzir em pequenos lotes através de funcionários multifuncionais. Evitar desperdícios e estoques tornou-se obsessão. Ao contrário do que pregaram um dia Taylor, Fayol e Ford, pais da produção em massa e especialização da mão-de-obra.

Cerca de 2.4 milhões de usuários americanos, europeus e chineses não sabem se podem utilizar seus carros. O pedal do acelerador pode travar, provocando acidentes. Os brasileiros podem respirar aliviados, uma vez que os modelos que rodam por aqui – produzidos em Indaiatuba ou importados do Japão – não foram afetados. O mesmo não se pode dizer da marca.

Um incidente destas proporções afeta não somente a empresa, mas consumidores, investidores, fornecedores e canais de distribuição. Os números comprovam.

Os preços das ações caíram 14% desde o anúncio do recall, corroendo o valor de mercado da empresa em U$ 21 bilhões. O que dizer das 1.234 concessionárias americanas? Especialistas apontam perdas de U$ 2.47 bilhões de dólares com a queda nas vendas de carros novos e usados. Ford e GM estão oferecendo mil dólares aos proprietários de veículos Toyota que migrarem de marca.

Apesar dos aspectos negativos de um recall, um bom gerenciamento pode diminuir seus impactos. Encontrei um interessante artigo – “Planning for and implementing a product recall” escrito pelos especialistas, David J. Wix e Peter J. Mone, os quais apresentam uma séria de dicas interessantes.

Com a globalização e o aumento na complexidade das operações, diversas empresas têm atuado em centenas de países com milhares de parceiros. Num cenário como este é praticamente certo que algum dia haverá algum tipo de problema a ser contornado. Desta maneira, torna-se imperativo um plano de ação global, o qual contemple:

  • – A criação e o treinamento de uma equipe multidisciplinar para o assunto;
  • – Os passos para comunicar consumidores, distribuidores, revendedores e parceiros;
  • – Procedimentos necessários para alertar as autoridades governamentais envolvidas;
  • – O rastreamento dos produtos na cadeia de distribuição – da produção ao consumidor

O alarme de um possível recall pode vir de diversas fontes. Consumidores, revendedores, distribuidores e funcionários. Não subestime nenhuma informação. Investigue, avalie e levante os riscos potenciais de forma rápida. Velocidade é crucial neste momento para mitigar boatos. Com o poder das redes sociais, acredito que consiga visualizar os possíveis estragos.

Prepare uma mensagem única evitando informações desencontradas, comum em momentos de pânico. O importante é que seja clara, não deixando margens para dúvidas ou questionamentos. Informe rapidamente o mercado, adotando uma postura pró-ativa. Telefonemas, e-mails, visitas ou informes publicitários em jornais ou televisão, dependendo do número de clientes afetados.

Conserte, retire ou substitua os produtos avariados. Crie um espaço na web, disponibilize posições de atendimento. Faça acordos com seus parceiros, caso necessite utilizá-los. O processo deve ser simples, fácil e rápido. Não há nada pior neste momento que a falta de informações e o jogo de empurra.

Infelizmente problemas deste tipo não ocorrem somente com grandes corporações. Visualize a empresa em que trabalha ou da qual é proprietário. Quantos produtos ou serviços poderiam expor seus clientes a situações limite? Perda de banco de dados, vazamento de informações, atraso nas entregas, roubos e fraudes. Lembra do caso ENEM? Como já dizia o velho ditado: é melhor prevenir que remediar.

escrito por Marcos Morita

Marcos Morita

Marcos Morita é mestre em Administração de Empresas, professor da Universidade Mackenzie e professor tutor da FGV-RJ. Especialista em estratégias empresariais, é colunista, palestrante e consultor de negócios. Há mais de quinze anos atua como executivo em empresas multinacionais.

Sobre o Autor: Marcos Morita

Marcos Morita é mestre em Administração de Empresas, professor da Universidade Mackenzie e professor tutor da FGV-RJ. Especialista em estratégias empresariais, é colunista, palestrante e consultor de negócios. Há mais de quinze anos atua como executivo em empresas multinacionais.

1 comentário

  1. MariValma Steiner

    O caso da Toyota é só mais um dos muitos que já aconteceram e dos que ainda estão por vir.
    A competitividade com orientação somente econômica tem levado empresas a cometerem erros quando usando algumas das ferramentas da globalização. Por exemplo: o desmembramento da produção com a participação de várias empresas em vários países tem levado a uma negligenciação do fator qualidade.
    Isso acontece não somente no caso de produtos, mas também o de serviços. Um bom exemplo é o caso de empresas de atendimento (call centers principalmente) ou de informática que tem migrado para a Índia. Empresas de call centers norte americanas têm treinado seus funcionários indianos a falarem com sotaque americano para dar mais “credibilidade” a seus funcionário indianos e evitar o sentimento “xenófobo” observado no setor. Mas será que basta se passar por um “very american” sem considerar o lado cultural e social? Será que as ações e reações são compatíveis por conta desses fatores? Será que essas empresas estão de fato preocupadas em solucionar os problemas do cliente com qualidade? Não seria mais honesto dar um treinamento de qualidade o que faria o fator origem cair ao chão?
    Outro bom exemplo é o da empresas de informática. Um especialista em programas para companhias aéreas me relatou as mudanças no setor desde que a Índia começou a ocupar o posto país dos experts em informática. Como é de se imaginar sua empresa reduziu enormemente seus postos de trabalho na Europa e migrou para a Índia, bom, isso é só a conseqüência mais óbvia. A empresa manteve (por enquanto) somente aqueles funcionários que considera “peças-chave” no processo. Aqui verifica-se muito claramente a questão cultural: Pelos relatos deste, o indiano tem uma cultura hierárquica muito forte e por este motivo sente-se fragilizado em confessar suas deficiências. O exemplo que me deu foi o de que após um treinamento qualquer, se perguntado quanto a existência de dúvidas, este cala-se mesmo tendo alguma (ou muitas) dúvidas. Isso é observado quando a execução de um projeto avaliado em 30 dias solta para 60 dias. Segundo este basta os instrutores retornarem aos seus países de origem para que os problemas se revelem ainda mais, é uma enxurrada de e-mails e reclamação dos clientes, no caso companhias aéreas.
    A intenção aqui não é desmerecer o conhecimento dos experts indianos nesta área, mas o de alertar as empresas que o fator cultural e social pode sim ser um obstáculo para toda essa transição que temos visto no mundo globalizado. E isto tem levado ao detrimento da imagem e da qualidade de um produto ou serviço.

  2. Juliana Emi Yamamoto

    Eu acredito que esse caso pode abalar, não somente a credibilidade da marca Toyota, como a imagem de qualidade dos produtos e serviços japoneses.
    O pronunciamento feito pelo presidente da Toyota nos EUA dia 24 de fevereiro de 2010 não foi considerado claro e não esclareceu os problemas na falta de segurança do automóvel. A pressão recairá portanto sobre o neto do fundador da marca, Akio Toyoda.

  3. Rubens Oliveira

    Nos últimos anos presenciamos o fenômeno do aumento da venda e consequentemente da produção de veículos automotores ao redor do globo. Com isso vieram as expansões, o aumento de postos de trabalho e o lucro das montadoras. Mas nem tudo é azul no mundo automotivo, a procura por reduções de custos de matéria prima e a busca pelo aumento da produtividade dentro das fábricas fatalmente afetam a qualidade do produto final. Acreditem, essa enxurrada de recalls é fruto do trabalho exaustivo de engenheiros que correram contra o tempo para entregar dentro do prazo (que com certeza era curtíssimo) as dimensões e os cálculos das peças aos fornecedores, que também tinham um prazo apertado para a estruturação do ferramental, contratação de mão de obra e entrega de um protótipo para aprovação da montadora, tudo isso por que um concorrente lançaria um modelo dentro de algumas semanas que afetaria diretamente as vendas de seus veículos diminuindo sua competitividade no mercado. É desta forma que o capitalismo atua. Porém, o recall não é bom nem para o consumidor final quanto menos para o fabricante, que acumula prejuízos devidos ao retrabalho. Nestes termos de dificuldades é que evoluímos, as montadoras evoluirão, e a Toyota certamente aprenderá uma grande lição com isso, e mais do que nunca continuará a produzir a distância o melhor carro do mundo.

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