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The Washington Post: o passado e o futuro da mídia

Por Marcos Morita

Era uma vez um pequeno rato que acidentalmente esbarrou em um leão adormecido. Irritado por ter sido acordado, apanhou-o com suas garras afiadas. Estava pronto para devorá-lo quando o pequeno roedor suplica, tentando convencê-lo que um dia poderia ajudá-lo, o que fez o rei dos animais soltar uma grande gargalhada concedendo-lhe a liberdade por esta razão. Pensava: como um bichinho tão pequeno poderia ajudar um animal tão grande? Certo dia o leão caiu numa armadilha, tentando em vão se libertar. Cansado e abatido rugiu por horas até que surge o pequeno rato do começo da história. Pacientemente rói as cordas da emboscada libertando seu benfeitor, pagando assim sua dívida.

Esta fábula de Esopo poderia ser aplicada à compra do jornal The Washington Post. O antigo leão da mídia fundado em 1877, controlado desde os anos 30 pelos herdeiros de Eugene Meyer, líder de circulação na capital do país mais rico do mundo e força poderosa na determinação das políticas da nação, adquirido de maneira simples e direta, comprado à vista e com dinheiro do próprio bolso por Jeff Bezos, fundador da Amazon por míseros U$ 250 milhões de dólares. Combalido pela crise que abalou a maior parte dos meios de comunicação tradicionais na última década, viu seu faturamento despencar 44% nos últimos seis anos, tornando-se a venda a melhor opção para fugir da falência.

A reviravolta pode ser descrita através do fenômeno conhecido como Cauda Longa, criado por Chris Anderson, editor chefe da revista americana Wired em seu livro homônimo. De acordo com o autor, o mundo antes da Web era em quase sua totalidade baseado na curva de Pareto(economista italiano do século XIX que realizou um estudo sobre renda e riqueza, observando que uma pequena parcela da população concentrava a maior parte da receita disponível) também conhecida como regra dos 80/20 ou cultura dos grandes hits. Os mais antigos certamente se lembrarão das filas gigantescas para assistir a pré-estreias de filmes como ET e Ghost nas esparsas salas de cinema localizadas em ruas ou galerias, as aglomerações para adquirir o último disco dos Rolling Stones em lojas especializadas como a lendária Hi-Fi na Rua Augusta, assim como o país reunido em torno da TV para assistir ao último episódio de Vale Tudo, descobrindo quem matou Odete Roitman. Sua exibição, em pleno sábado de Natal, registrou picos de 92 pontos de audiência no Ibope.

Trazendo para o tema do artigo, Cid Moreira e Sergio Chapelin, hoje respectivamente narrador de bíblias e apresentador de segundo escalão às sextas-feiras, reinavam absoluto na bancada do Jornal Nacional numa época em que os únicos canais para se atualizar sobre as notícias eram as ondas de amplitude modulada, os telejornais noturnos e as bancas, hoje pontos de venda de sorvete, cartões pré-pagos de celular e também jornais. Saudades dos tempos em que pessoas se aglomeravam logo pela manhã, lendo as manchetes afixadas em suas paredes metálicas.

Esta cultura baseada em hits se estabelecia em grande parte devido a escassez de espaço característica da economia dos átomos, batizada pelo editor chefe. As antigas lojas de discos e locadoras de vídeo tinham sua oferta limitada as prateleiras nas quais os vinis ou DVDs eram dispostos por gênero ou ordem alfabética, razão pela qual eram preenchidas com itens de alto potencial de vendas – os famosos arrasa quarteirões – mesmo que sua qualidade fosse duvidosa, evitando-se assim encalhes. Crepúsculo, Lua Nova, Gustavo Lima e Munhoz e Mariano com seu Camaro Amarelo. O mesmo ainda ocorre com a TV aberta e seu espectro finito, apresentando velhas fórmulas baseadas em programas de auditório, novelas e reality shows, cuja audiência apesar de decrescente, representam a fórmula de cultura massificada.

Com o surgimento da internet, a melhoria da capacidade de transmissão de dados através da banda larga e o aumento no poder de processamento e armazenamento de informações, conforme lei de Moore (que surgiu em 1965, através de um conceito estabelecido por Gordon Earl Moore, fundador da Intel. Tal lei dizia que o poder de processamento dos computadores dobraria a cada vinte e quatro meses.)trouxe uma inversão na cultura dos grandes sucessos. As antigas lojas de tijolo e cimento, por exemplo a norte americana Blockbuster, substituídas por sites de música, portais online e lojas virtuais, tais como iTunes, Netflix e a própria Amazon, onde as dimensões físicas já não são mais um gargalo, uma vez que o custo para adicionar um filme ou música é próximo a zero. A inversão se encontra no fato de que a somatória de todos os itens de baixo giro, até então rejeitados pela cultura de massa, produzem um volume de negócios significativo, mesmo que suas vendas sejam ínfimas individualmente, revertendo a lógica de Pareto.

Neste cenário, abre-se espaço para novos cantores, escritores, produtores e autores até então desconhecidos atingirem diretamente seu público consumidor, seja através dos portais ou diretamente em vídeos publicados no You Tube. O sul coreano Psy é seu exemplo mais contundente. Traduzindo o fenômeno à mídia impressa, notícias são acessadas a qualquer momento através dos mais diversos dispositivos: smartphones, tablets, notebooks e desktops, propagadas em portais de notícias, blogs especializados e twitter, só para mencionar alguns exemplos.

Concluindo, manter um jornal no velho formato: reportagem, impressão, distribuição e venda nas bancas ou assinaturas é o mesmo que alugar vídeos mantendo uma infraestrutura de lojas físicas ou vender discos em lojas de shopping centers. DVDs e CDs já se mostraram obsoletos e ultrapassados. O velho formato em papel ainda teima em resistir. Por quanto tempo ainda não se sabe ao certo, da mesma maneira que é desconhecido o motivo pelo qual Bezos adquiriu o velho e ultrapassado jornal. Oportunidade de negócios, obsessão ou quem sabe a revanche do rato cujo leão um dia o desdenhou.

Marcos Morita é mestre em Administração de Empresas, professor da Universidade Mackenzie e professor tutor da FGV-RJ. Especialista em estratégias empresariais, é colunista, palestrante e consultor de negócios. Há mais de quinze anos atua como executivo em empresas multinacionais.

Sobre Marcos Morita:
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escrito por Marcos Morita

Marcos Morita

Marcos Morita é mestre em Administração de Empresas, professor da Universidade Mackenzie e professor tutor da FGV-RJ. Especialista em estratégias empresariais, é colunista, palestrante e consultor de negócios. Há mais de quinze anos atua como executivo em empresas multinacionais.

Sobre o Autor: Marcos Morita

Marcos Morita é mestre em Administração de Empresas, professor da Universidade Mackenzie e professor tutor da FGV-RJ. Especialista em estratégias empresariais, é colunista, palestrante e consultor de negócios. Há mais de quinze anos atua como executivo em empresas multinacionais.

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